Parabéns para elas!

(*) Sthevo Damaceno é jornalista e
editor do jornal Mania de Saúde.
sthevodamaceno@maniadesaude.com.br

Sthevo Damaceno
Dias atrás, no saguão de um prédio comercial da cidade, fui tomado por aqueles movimentos nitidamente proustianos, memorialísticos, que tanto me refiro aqui – e de repente me vejo espelhado naquela horda de crianças de uns 10 anos de idade, magras e raquíticas, todas de mãos dadas às suas mães, decerto aguardando uma consulta com um pediatra ou outro especialista na área da saúde. O motivo é que cenas como aquelas fizeram parte de toda a minha infância, não apenas por conta de um corpo franzino e de uma saúde fragilizada, mas, especialmente, pelo comportamento irascível de um verdadeiro “moleque de rua”, exposto aos mais diversos tipos de adoecimentos e acidentes, pela mera liberdade daqueles tempos analógicos. Foi curioso, então, ver aquelas senhoras ali, quase três décadas depois, apresentando a mesma abnegação de minha mãe, que era capaz de deixar todas as obrigações rotineiras do lar (e não eram poucas) para gastar horas na estrada (éramos de um distrito de interior), levando um tempo enorme até chegar à cidade (sem Uber ou GPS) para, no final, ainda enfrentar as filas intermináveis de atendimento e, só à noite, após essa longa odisseia, fazer o processo de volta. Isso para não falar da natação, recomendada por um médico da época como “profundamente necessária para minha saúde”, ignorando ele que a rotina de minha mãe era carregar-me a pé por quase 5 km, sob o sol inclemente, depois de passar 1 hora e meia dentro de um ônibus vagaroso, para só assim chegar ao local indicado – e, depois, ter que fazer o mesmo processo regressivo e sempre e sempre e sempre… Parabéns para elas! (Sem dizer que estamos falando de uma típica mulher de classe média baixa, na virada dos 1980 para os 1990, aquela época tão politicamente incorreta, onde a cultura da maioria dos homens de família – em que pese as exceções – era o de mero provimento e só, bem diferente de hoje, onde ser pai ganhou um contexto muito maior para todo homem, que exerce um papel bem mais ativo no processo do cuidado à criança, desde a higiene até os deveres da escola). Mas eis que toda essa nuvem proustiana se desfaz e me vejo ali, com o porteiro do prédio a me chamar, sob o olhar daquelas inúmeras mães de repente se dando conta de um estranho a observá-las. Mal sabiam elas que, naquele instante, elas foram uma única mãe, como a minha também ao longo da vida – no fundo, cientes de que só o amor incondicional que tanto carregam seria capaz de suportar o peso da cruz. O ditado pode ser controverso, mas não deixa de ser verdadeiro: mãe, de fato, é uma só.