(*) Sthevo Damaceno é jornalista e
editor do jornal Mania de Saúde.
sthevodamaceno@maniadesaude.com.br

Não faz muito tempo, alguns amigos se assombraram quando lembrei-lhes de Walt Whitman, que conheciam de nome. O espanto veio por conta de um texto do final do século XIX, em que Whitman afirmava estar “pleno de vida agora, consistente, visível” e se dirigia ao futuro e ao homem que vivesse no século XX, “ou dentro de quantos séculos for”, dando-lhe um recado peculiar: “A ti, que ainda não nasceste, dirijo este canto/ Quando leres isto, eu, que agora sou visível, terei me tornado invisível/ Enquanto tu serás consistente e visível, e darás realidade a meus poemas, voltando-te para mim/ Imaginando como seria bom se eu pudesse estar contigo e ser teu camarada/ Faz de conta então que eu estou contigo/ (E não o duvides muito, porque eu estou aí nesse momento).
Nestas poucas linhas, traduzidas por Ferreira Gullar, o poeta estadunidense atravessa a temporalidade e estende-nos a mão, exemplificando, assim, a força atemporal da literatura, tão comentada por diversos escritores, mas nem sempre traduzida em palavras. Algo que remete ao argentino Jorge Luis Borges (grande leitor de Whitman, aliás), para quem a literatura só existe quando “o leitor e o livro se encontram, fazendo com que os escritores saltem das páginas para os nossos braços”, para usar outra imagem do poeta.
Curiosamente, Whitman parece ter vencido não apenas o tempo, mas também os meios em que se expressava. Afinal, sua influência pode ser vista em muitos outros lugares além dos livros. Por exemplo: quem assistiu a série Breaking Bad deve se lembrar das muitas cenas em que o personagem principal, Walter White, se vê envolvido com o famoso livro de Whitman, “Leaves of Grass” (Folhas de Relva). A própria Breaking Bad, inclusive, possui muito mais ligação com a obra de Whitman do que as cenas de Walter sugerem, como demonstrou muito bem o crítico Max Valarezo, do canal “EntrePlanos”, que faz sucesso no Youtube.
Outro ponto de referência bastante popular sobre Whitman é o filme “Sociedade dos Poetas Mortos”, de Peter Weir. Lançado em 1989, o longa conquistou gerações de fãs e tem como um de seus pilares a poesia de Whitman, que foi apresentada aos alunos de um tradicional colégio americano pelas mãos de um professor nada ortodoxo, vivido brilhantemente por Robin Williams.
No filme, a liberdade e o gosto pela existência, cantados por Walt Whitman, parecem ir de encontro à vida daqueles jovens adolescentes, quando sentiam-se podados por terem que decidir o próprio futuro sem estarem prontos para isso. É o professor vivido por Williams que vem lembrar aos estudantes a importância de saborear a vida, eternizando as célebres palavras de Horácio, “carpe diem” (ou “aproveite o dia”). Esta é a mensagem que Robin Williams passa o tempo inteiro aos alunos, clamando para que vivam da melhor forma possível, seguindo os próprios sonhos e sendo fiéis a si mesmos. Um filmaço, que traduz muito bem o espírito do poeta.
Pena que Walt Whitman, como autor em si, nem sempre seja tão lembrado ou lido como deveria – muito embora sua poesia, como se vê, continue ecoando sobre os telhados do mundo.