Seu filho está nessa?

O dado é alarmante e confirma aquilo que os adultos de hoje já sabem: a nova geração vem apresentando um QI (Quociente de Inteligência) mais baixo do que a anterior. É o que mostrou, há pouco tempo, uma série publicada pela BBC News Brasil, sobre os chamados “nativos digitais”. Segundo o texto, estes são os primeiros filhos com QI inferior aos pais e estão sendo registrados em diversos países, incluindo Noruega, Dinamarca, Finlândia, Holanda e França, que, historicamente, sempre detiveram altos índices educacionais quanto às crianças. Embora os testes de QI venham demonstrando que as novas gerações são menos inteligentes que as anteriores, ainda não há uma comprovação do porquê isso está acontecendo, como destacou a BBC. Mas o neurocientista francês Michel Desmurget, que tem se debruçado sobre o assunto, afirma que a poluição e exposição a telas podem ser fatores muito influentes na atualidade. Mas não precisamos ir à França para perceber essa realidade que, de tão presente, chega a ser tátil, quase pegajosa, para parafrasear Carlos Drummond de Andrade (aliás, se seu filho adolescente nunca ouviu falar neste nome, já é um mau sinal, não acha?). É fato: basta olhar a nossa volta para ver a quantidade de filhos, sobrinhos e netos que passam o dia inteiro grudados ao celular – e pior, sem perder mais tempo com aqueles jogos interativos que, até poucos anos atrás, eram a regra-geral e, em alguns casos, tinham um cunho educativo. Há alguns dias, por exemplo, vi uma roda de crianças reunidas em torno do celular, visualizando vídeos do Tik Tok, freneticamente. Depois, soube que isso era uma rotina para a maior parte delas. Mas qual o perigo disso, se há tantos conteúdos produzidos para os jovens, não é mesmo? Bem, não sou nenhum educador, mas basta utilizar a plataforma para notar que o conteúdo comportamental é um dos pilares daquela rede de vídeos, não raro com questões superficiais da vida moderna, que acabam atraindo a atenção dos mais novos, dentro da típica curiosidade de saber como é o “mundo adulto”. Mas não é necessário fazer muito esforço para notar que todo o tempo perdido na plataforma poderia ser melhor aproveitado em meio aos… livros. Se um vídeo do Tik Tok pode ensinar as “3 maneiras mais incríveis de falar no WhatsApp com o crush”, um clássico como “O Encontro Marcado”, de Fernando Sabino, lido por tantas e tantas gerações de adolescentes no Brasil, ensinaria muito mais do que isso a esse hipotético jovem: mostraria a ele toda a curva ascendente de uma criança e todos os seus dilemas existenciais até à fase da maturidade, expondo, com o requinte filosófico que só a literatura é capaz, os dramas da juventude, a iniciação amorosa, o trato com os amigos e familiares, a crueza de saber-se só no mundo e senhor de seu destino – isso tudo com todo o apuro de linguagem capaz de aprimorar, em muito, o vocabulário do leitor e abrir as portas para todo o legado da cultura ocidental, tendo em vista que “O Encontro Marcado” traz todo um caleidoscópio de citações e referências à nossa cultura justamente para enriquecer o repertório de quem acompanha Sabino nesta jornada. O grande Ferreira Gullar (seu filho já ouviu falar dele também?) dizia que uma das maiores misérias do nosso país era o imediatismo. Nada mais correto. Ter uma criança ou um jovem se distraindo no celular pode ser conveniente para muitos de nós, adultos, que não temos muito tempo ou disposição para interagir com eles – com as devidas exceções, é claro. Mas é fato: quando este filho chegar “às portas do que importa”, como dizia o poeta, a conta virá. Sendo assim, aquele filho cujo futuro é tão ansiado terá a capacidade intelectual necessária para enfrentar aquele vestibular? E quanto à vida? Estarão realmente prontos para o futuro? Fica a pergunta. A resposta, é claro, pode ser um pouco mais complexa. Mas está em cada um de nós.